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Foto do escritorLuis Paulo Dutra

Crianças podem ter AVC?



É muito comum ouvirmos falar de AVC (Acidente Vascular Cerebral) nos adultos, "você viu que fulano de tal teve um derrame!", mas quase nunca ouvimos falar de AVC em crianças, não é mesmo? Apesar de ser um evento muito mais raro do que nos adultos, ele pode acontecer, e por vários motivos diferentes.


Criança segurando uma placa: eu sobrevivi ao AVC
Eu sobrevivi a um AVC!

Mas antes de falarmos dos motivos, vamos tentar entender um pouquinho sobre o que ele é: AVC é quando o cérebro sofre uma lesão devido alguma alteração na circulação sanguínea. Ele pode ocorrer devido ao entupimento de um vaso que leva o sangue rico em nutrientes para o cérebro (AVC isquêmico), por sangramentos dentro do cérebro (AVC hemorrágico). Nesses 2 casos estamos falando dos vasos arteriais (que levam sangue do coração para o cérebro, mas ainda poderíamos citar as obstruções dos vasos que carregam o sangue do cérebro de volta para o coração a trombose venosa central (TVC ou infarto venoso).



AVC hemorrágico (desenho)
1. AVC hemorrágico
AVC isquêmico embólico (infarto cerebral)
2. AVC isquêmico embólico (infarto cerebral)



















AVC na infância é comum?


Nas crianças, o AVC é um evento raro. Mas devido a gravidade da maioria dos casos é um diagnóstico importante de ser pesquisado, segundo dados da OMS é a 6 causa mais comum de mortalidade na faixa etária pediátrica! Nos EUA, dados mostram que em média 3.000 crianças podem ter um episódio de AVC por ano.


Quais são as causas de AVC na infância?


Enquanto em adultos, os principais fatores de risco são diabetes e hipertensão, na criança os fatores de risco são completamente diferentes e dos mais diversos.

Entre as causas podemos citar:

  • Prematuridade e complicações do parto

  • Doenças na formação dos vasos sanguíneos (malformações - MAV)

  • Doenças de coração (malformações como tetralogia de Fallot)Doenças e tratamentos que aumentam o risco de coagulação sanguínea (anemia falciforme, trombofilias, uso circulação extracorpórea para cirurgia cardíaca)

  • Traumatismo craniano

  • Alteração nos vasos, chamadas de arteriopatias (vasculites, pós infeciosa - varicela, moyamoya)

  • Infecciosas (meningite)

  • Relacionadas a doenças sistêmicas (sepse)


Malformação arteriovenosa (MAV), uma alteração que ja pode estar presente ao nascimento e causar sintomas só mais tarde
Malformação arteriovenosa (MAV)


Como desconfiar que meu filho está tendo um AVC?


Em crianças menores de 28 dias de vida, em geral não apresentam sintomas evidentes do AVC, crises convulsivas são os mais frequentes e podem se apresentar como movimentos repetidos de um lado do corpo, momento em que mantém o olhar fixo e não reage ao toque e/ou momento de interrupção na respiração apneia. É raro que nessa faixa etária tenha paralisia, mas esses eventos podem ser a causa de uma paralisia descoberta mais tardiamente.

Crianças maiores de 28 dias geralmente tem um quadro mais claro, os principais sintomas são:

  • Confusão mental e/ou sonolência

  • Dificuldade de movimentar um lado do corpo (hemiplegia)

  • Incapacidade de falar (afasia)

  • Formigamento ou dormência de uma lado do corpo

  • Desequilíbrio (ataxia)


Essa imagem representa sintomas comuns do AVC nas crianças com o acronimo BEFAST! B de balance loss (perda do equilíbrio) E eyesight changes ( alterações visuais) F face dropping (paralisia de um lado do rosto) A Arm weakness (fraqueza dos braços) S speech dificulty (dificuldade na fala) T Time do call 911 (hora de ligar para o SAMU 192)
Essa imagem representa sintomas comuns do AVC nas crianças com o acronimo BEFAST! B de balance loss (perda do equilíbrio) E eyesight changes ( alterações visuais) F face dropping (paralisia de um lado do rosto) A Arm weakness (fraqueza dos braços) S speech dificulty (dificuldade na fala) T Time do call 911 (hora de ligar para o SAMU 192)

Para ajudar a lembrar desses sintomas usamos o SAMU:

Sorria (a pessoa não consegue levantar os dois lábios para sorrir e a boca fica torta)

Abrace (a pessoa tem dificuldade de levantar os braços)

Música (dificuldade de falar, a fala fica enrolada)

Urgente (ligue 192)




Meu filho começou com um desses sintomas de AVC, e agora?


Ligue para o SAMU! A investigação deve ser feita no hospital, quanto mais rápido o diagnóstico melhor é a resposta ao tratamento.

Para confirmar o diagnóstico, são solicitados alguns exames de imagem. O primeiro exame a ser pedido é uma tomografia de crânio, que tem como finalidade diferenciar o AVC hemorrágico do isquêmico. Se estamos lidando com um AVC hemorrágico, o sangue é facilmente detectado pela tomografia, mas se estamos lidando com AVC isquêmico, a tomografia pode vir normal por até 12h. Isso quer dizer que uma tomografia de crânio normal não descarta AVC!



Outros métodos de imagem podem ser utilizados, como a angiotomografia e a angiorressonância, que são exames capazes de ver com maiores detalhes toda a circulação sanguínea do cérebro. É só dessa forma que é possível uma confirmação inequívoca de um AVC isquêmico em uma fase bem precoce (até 6 horas do início). Apesar de eles apresentarem mais detalhes que a tomografia simples, trata-se de exames mais caros, nem todos os hospitais têm acesso a esses exames e são mais demorados de serem feitos.

Depois de confirmado o diagnóstico, é importante transferir a criança para uma UTI pediátrica, onde ela receberá todos os cuidados necessários, como controle de pressão arterial e tratamento para desinchar o cérebro.

Hoje em dia começa a ser discutido para as crianças e adolescentes com AVC isquêmico o uso de trombolíticos (substâncias que desobstruem os vasos) dentre eles o alteplase, assim como é feito em adultos. Porém ainda trata-se de uma conduta polêmica, principalmente porque as causas de AVC nas crianças são muito diferentes das dos adultos. O trombolítico é excelente para remover os trombos que são as principais causas nos pacientes hipertensos diabéticos e cardiopatas, mas se for uma vasculite ele só aumentaria a chance de um sangramento após o uso. Lembrando também que ele tem regras bem rígidas para o uso como o tempo máximo de até 6 horas após o inicio dos sintomas para aplicação (janela terapêutica). Considerando as possíveis complicações e as dificuldades de um diagnóstico rápido na pediatria ainda se trata de um tratamento de uso limitado. Mas sim quando bem indicado pode mudar completamente a evolução do quadro!


Depois de passada a fase aguda (alguns dias a semanas), o foco agora é outro! Precisamos focar na reabilitação física, psicológica e de linguagem da criança. As crianças têm uma capacidade muito grande de criar novas conexões entre as células do cérebro muito mais rápido que os adultos. Isso devido a uma maior neuroplasticidade do cérebro da criança. Então precisamos aproveitar este momento para minimizar as sequelas que a criança possa vir a ter e isso pode ser realizado através de u acompanhamento multidisciplinar com fonoaudiologia, terapia ocupacional, fisioterapia. O importante nesse momento é a intensidade (quantidade de horas e intensidade das atividades) nos primeiros meses!


Para otimizar a evolução é essencial que acompanhe com o neuropediatra, para coordenação a equipe, tratamento de outras complicações que poderiam prejudicar a recuperação (crises convulsivas) e orientação da família.



Se gostou desse artigo compartilhe com colegas e família! Afinal queremos ajudar as pessoas a reconhecer mais facilmente esses sintomas e buscar atendimento o quanto antes! Tempo é cérebro! se vc suspeitou busque atendimento! Para que existam mais rostos felizes como esse acima! 😊






Autora do texto: Tamires Pereira de Souza


Acadêmica de medicina da UNIFENAS-Alfenas














Coautor e revisor Luis Paulo F S Dutra, médico neurologista pediátrico.


Para mais informações sobre coautor e revisor do texto clique no logo ao lado.







Referências


MALONE, L. A.; FELLING, R. J. Pediatric stroke: unique implications of the immature brain on injury and recovery. Pediatr Neurol, Baltimore, United States, v. 102, p. 3-9, 2020.


FELLING, R. J.; RAFAY, M. F.; BERNARD, T. J.; et al. Predicting Recovery and Outcome After Pediatric Stroke: Results from the International Pediatric Stroke Study. Annals of Neurology, Baltimore, United States, 2020.


FILHO, E. M.; CARVALHO, W. B. Acidentes vasculares encefálicos em pediatria. Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro, Brasil, v. 85, n. 6, 2019.

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